A Praia |
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«I try to be as progressive as I can possibly be, as long as I don't have to try too hard.» (Lou Reed)
segunda-feira, maio 30, 2005
Umbiguismo hardcore
Escrever a palavra «praia» no google e clicar «I'm feeling lucky».
Spanglish
De cada vez que pego na Atlântico, fico com a impressão de estar a ler más traduções do inglês. Vejamos os dois primeiros textos que me calhou ler neste número. Pág.50, João Tordo: «Só mais de setenta páginas depois do [sic] livro [Junky, de William Burroughs] começar, aprendemos que a personagem principal, William Lee, tem uma mulher». «É ainda no prefácio que Burroughs expõe a sua atitude nada apologética em relação ao uso das drogas». (O autor pretende, evidentemente, dizer o oposto.) Pág.13, António Araújo: «É tão grande o desfasamento entre a justificação teorética do 'direito à pornografia' e a realidade dos factos que aquela justificação começa a revelar-se ilusória ou fantasiosa.» (Como pergunta o google: «Será que quis dizer: teórico»?)Em contrapartida, no número 1 Soares Silva foi convertido em português de Portugal, talvez para o caso de alguém não perceber o sotaque do Brasil. Esta ansiedade com o português «bastardo», ao mesmo tempo que se incorpora o inglês à bruta, parece-me muito sintomática. Não é apenas na forma, mas também na substância, que a revista é um inglês mal traduzido. E o pior é que suspeito que se, por hipótese, a Atlântico fosse publicada em inglês, eu acabaria com a impressão de estar a ler um português mal traduzido.
Adendas ao post anterior
![]() Scrap it (1) A ler todos os dias, como eu faço, o blog do Pedro Magalhães, e hoje, especialmente, esta curta observação. (2) Sendo em princípio a favor da Constituição Europeia para favorecer a união política, parece-me, por isso mesmo, que na situação presente talvez seja melhor deitá-la no caixote do lixo. Nem que isso me obrigue a votar não no referendo que se anuncia para Portugal. É preferível conservar a salada dos tratados anteriores a «avançar» com a UE sem a França. Por outro lado, fazer alterações cosméticas ao Tratado para o enfiar pela goela dos franceses tão pouco me parece boa ideia: pelos tempos mais próximos, a credibilidade democrática da Constituição estará manchada.
O caminho referendário para a união europeia
![]() [Fragmento do artigo de Pedro Magalhães (29.5.2005), que convém ler no seu conjunto mas só está disponível online para assinantes do Público] «Ao contrário do que sucede nas eleições legislativas - onde identificações ideológicas e partidárias dão robustez ao voto - as tendências do «Sim» e do «Não» ao longo do tempo são directamente atribuíveis a uma longa colecção de «factóides» políticos. Jospin fala na televisão e o «Sim» sobe. Há protestos sobre o «trabalho grátis» na segunda-feira do Pentecostes e o «Sim» desce. Chirac dirige-se ao país em apelo desesperado e o «Não», que já parecia decidido, volta a estar em causa: duas das três derradeiras sondagens realizadas nos últimos dois dias da campanha (TNS Sofres e CSA) dão «empate técnico». Num cenário destes, atirar moedas ao ar é quase tão bom como fazer inquéritos. Mas esta quase aleatoriedade das intenções de voto e dos resultados não é apenas um problema para as sondagens. Qual é o projecto político que prevalecerá hoje depois de uma vitória do «Sim» ou do «Não» em França? Que informação concreta é transmitida ao poder político? Mais «liberalismo»? Ou mais «estatismo»? Abertura ou fechamento à Turquia? (...) Pró- ou anti-integracionismo? (...) A partir de amanhã, haverá com certeza uma legião de políticos e comentadores que se encarregarão da preciosa tarefa de nos ilustrar sobre estas matérias. E é garantido que alguma versão dos acontecimentos acabará por prevalecer. Mas sabendo o que sabemos de antemão sobre as motivações dos eleitores, poderá essa versão fazer algum real sentido? E se a resposta for não, então para que servem, exactamente, estes referendos?» Outra: para que servirá o referendo em Portugal, daqui por quatro meses e picos? Para sustentar a fantasia de que a Constituição pode subsistir se assim o quisermos, mesmo que a França a tenha rejeitado? Não nos arriscamos a acabar na situação, muito irónica, de ter pela primeira vez a oportunidade de votar sobre um tratado europeu no momento em que esse tratado já estará, para todos os efeitos práticos, morto? De sermos finalmente interrogados, para descobrirmos que a questão já nem sequer existe? Mas hoje é ainda a noite em que, excepcionalmente, o Abrupto se apresenta numa nota de lirismo: «Está aberto o caminho [para uma Europa] mais democrática, mais solidária, menos ambiciosa e mais prudente.» Bonito programa; há objecções? domingo, maio 29, 2005
Disse um dos cavalheiros com energia
Cortesia de dois bloggers que não vou nomear para não os meter em sarilhos, aqui fica a referida crónica de João Carlos Espada de 30 de Abril, a página Mar Adentro do «Actual» do Expresso. Espero que se divirtam.Uma Inglaterra que já não é? João Carlos Espada Expresso, 30 de Abril de 2005 Profundo sentido de decência «William Deakin representou a Inglaterra que todos nos habituámos a admirar. Uma Inglaterra livre e ordeira, orgulhosa mas discreta, polida e gentil, uma Inglaterra, sobretudo, com um profundo sentido de decência. Numa palavra, William Deakin representou uma Inglaterra que já não é.» Estas foram as palavras emocionadas de Lord Dahrendorf - cidadão britânico, ex-ministro alemão e ex-comissário europeu da antiga República Federal da Alemanha - na cerimónia de homenagem do St.Antony's College, de Oxford, ao seu fundador, recentemente falecido, William Deakin. No vasto salão do colégio, um longo silêncio envolveu as centenas de participantes na cerimónia. E as palavras de Dahrendorf ecoavam pesadamente sobre nós: «An England with a deep sense of decency. An England that no longer is.» 25 de Abril na velha Inglaterra Comemorei os 31 anos da nossa democracia na velha Inglaterra, com um grupo de mestrandos e doutorandos do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa que estudaram ou ainda estudam em Oxford, ao abrigo de um programa de intercâmbio entre aquelas universidades - um programa, por sinal, muito raro na Universidade de Oxford. Na sexta-feira, 22 de Abril, jantámos e pernoitámos no Oxford and Cambridge Club, de Londres. No sábado de manhã, visitámos os Cabinet War Rooms e o Churchill Museum. À tarde, já em Oxford, assistimos à homenagem a William Deakin, no St. Antony's. Ao jantar, no Old Bank Hotel, da High Street, discutimos intensamente pela noite dentro «a Inglaterra que já não é» - ou, talvez, o Ocidente que já não é. No domingo, tomámos o autocarro para Blenheim, o palácio dos duques de Malborough, antepassados de Winston Churchill. Foi neste berço grandioso - talvez excessivamente grandioso para o gosto discreto inglês - que Winston nasceu, por acaso e prematuramente, a 30 de Novembro de 1874. A glória do jardim Foi uma prolongada visita à velha Inglaterra. Aquela que, como recordou Dahrendorf, nos habituámos a admirar enquanto símbolo da democracia, da liberdade ordeira e, de novo Dahrendorf, de um profundo sentido de decência. É inútil tentar definir este profundo sentido de decência na linguagem racionalista das ideologias modernas. É mesmo possível argumentar que o apogeu das ideologias na mente moderna é o que subjaz à erosão da Inglaterra de Dahrendorf. Ao contrário das ideologias modernas, a velha Inglaterra não se dá a conhecer em teorias abstractas alegadamente assentes em premissas racionalmente demonstradas. Ela revela-se gradualmente apenas àqueles que sabem ser tocados por ela - e que procuram então descobri-la, sem querer dominá-la com teorias abstractas. Rudyard Kipling captou em boa parte este mistério: «Our England is a garden that is full of stately views, Of borders, beds and shrubberies and lawns and avenues, With statues on the terraces and peacoks strutting by; But the Glory of the Garden is more than meets the eye.» A erosão das maneiras Se há um aspecto onde a erosão da Inglaterra de Dahrendorf é hoje visível a olho nu é, sem dúvida, o das maneiras. Até no Oxford and Cambridge Club, alguns sócios protestam - até agora apenas com êxito ao pequeno-almoço - contra a obrigatoriedade de usar casaco e gravata. Edmund Burke insistia que «as maneiras são mais importantes do que as leis. Delas dependem, em grande parte, as leis. A lei toca-nos apenas aqui e ali, de vez em quando. As maneiras é o que nos agride ou conforta, nos corrompe ou purifica, nos degrada ou enobrece, nos barbariza ou refina, através de uma operação constante, firme, uniforme e insensível, como o ar que respiramos. Elas dão toda a cor e forma às nossas vidas. Consoante a sua qualidade, elas ajudam a moral, fornecem-na, ou então destroem-na completamente». Ditadura relativista Na segunda-feira, 25 de Abril, de novo em Londres, participei num almoço-debate sobre a eutanásia no «think-tank» Politeia. As palavras de Dahrendorf, ausente neste debate, ressoaram de novo na minha memória à medida que o debate se desenrolava. A maioria dos presentes mostrava-se muito preocupada com o subtil crescimento de «uma cultura de morte» que hoje banaliza e tenta destruir o que antes era um absoluto moral: o respeito pela vida. Um dos intervenientes - que, de acordo com as «Chatham House Rules», não estou autorizado a identificar - foi mesmo ao ponto de dizer o seguinte: «A banalização da vida é o primeiro passo para a banalização do mal. Os alemães que se recordam do nazismo sabem isso muito bem, e não é por acidente que na Alemanha existe uma enorme resistência à legalização da eutanásia. Se a eutanásia é hoje apresentada como banal pelos 'media', isso deve-se à feroz destruição dos nossos padrões morais que tem sido operada pela nova ditadura politicamente correcta: a 'ditadura do relativismo', se os cavalheiros me permitirem citar o novo Papa da Igreja católica romana.» Secularistas evangélicos O que se seguiu foi um pouco surpreendente. Não só os cavalheiros permitiram que o Papa Bento XVI fosse citado, como vários intervieram depois para o citar. «O relativismo está a destruir o Ocidente, porque prega a equivalência de todos os padrões morais, impedindo a discussão sobre os padrões. Não foi nesta Inglaterra relativista que eu fui educado», disse um dos cavalheiros com energia. «Na verdade, estamos submetidos a uma ditadura dos 'media' politicamente correctos: se alguém fala em moral, para nem dizer em religião, acusam-no de fundamentalista e extremista, e ele é obrigado a calar-se. É acusado de fundamentalista evangélico, mas, na verdade, o que hoje temos é secularistas evangélicos que proíbem a discussão da moral e da religião na praça pública.»
Eu compreendo
Estou com o senhor Primeiro-Ministro: já calculava que este ano o défice seria grande, mas as proporções que está a atingir não as podia ter imaginado. Naturalmente, vou ter que quebrar promessas.
A restauração das maneiras
Tenho para mim que João Carlos Espada é, presentemente, o único cultor português da ironia queirosiana. Talvez não seja (ainda) acertado comparar Espada ao grande romancista português do século XIX do ponto de vista da excelência linguística; mas ninguém como ele, semana após semana, na última página do suplemento «Actual» (indispensável) do jornal Expresso (imprescindível), cultiva no nosso país a ironia subtilíssima, frase a frase, em crescendo do início para o fim do texto. Folgo em notar que outros, como Rui Tavares, parecem já ter-se dado conta do mesmo.Desta semana - «Uma cultura de respeito», um texto que em todo o caso não é dos seus mais brilhantes - retiro por exemplo o seguinte: Blair soma e segue. Enquanto a Alemanha e a França se distraem com inimigos imaginários, o primeiro-ministro inglês escolhe inimigos reais. No discurso da Rainha, a tradicional apresentação do programa do primeiro-ministro, Sua Majestade apresentou como prioridade a restauração de «uma cultura de respeito» no Reino Unido. Os inimigos, aqui, são bem reais: o crime e a insegurança nas ruas, a indisciplina nas escolas, a má-criação e a grosseria, a erosão das maneiras que sempre distinguiram os ingleses. Depois de aqui ter escrito, há algumas semanas, um artigo sobre «a Inglaterra que já não é» [30 de Abril, um dos mais notáveis - felizmente recortei-o], mal posso acreditar que o primeiro-ministro britânico tenha escolhido como sua prioridade a restauração das maneiras. Mas a verdade é que escolheu. Os cínicos dirão que a comparação entre Espada e Eça de Queirós é desajustada, porque Espada não compreende a sua própria ironia e é, basicamente, um parvalhão. A esses, recordarei o seguinte: primeiro, chamar parvalhão a uma pessoa é socialmente mal compreendido, ainda que seja a João Carlos Espada; segundo, que a obra vive e perdura para além das intenções, sempre insondáveis, do seu autor. Desfrutemos pois o Expresso como nos aprouver. Encontro todas as semanas nas páginas deste jornal razões para um gosto renovado. E juro, juro pela minha saúdinha que aguardo ansiosamente pela publicação em livro das crónicas do Professor Espada, a obra mais esperada desde o livro do Pipi. PS. Se algum gentil leitor tiver a assinatura eletrónica do Expresso e quiser fazer o favor de me enviar o dito texto de 30 de Abril, eu cumprirei a missão filantrópica de o divulgar aqui integralmente, pirateando-o ao serviço de todos. terça-feira, maio 24, 2005
Manhã
Estava à espera de dias assim, em que nem de madrugada precisamos de fechar a janela, para pôr a tocar esta gravação de 1959 do João Gilberto (que está compilada, com todas as outras canções do período 1958-61, no duplo cd O Mito).Manhã de Carnaval (Luiz Bonfá / Antônio Maria) Manhã, tão bonita manhã Na vida uma nova canção Cantando só teus olhos Teu riso tuas mãos Pois há de haver um dia Em que virás Das cordas do meu violão Que só teu amor procurou Vem uma voz falar Dos beijos perdidos Nos lábios teus Canta o meu coração Alegria voltou Tão feliz na manhã desse amor segunda-feira, maio 23, 2005
Cheerleaders (2)
![]() Da secção de cartas do Economist: SIR – I agree with the state representatives of Texas: “overtly sexually suggestive” routines by cheerleaders must be stamped out (“Has it come to this?”, May 7th). Where do I apply for the post of “cheerocrat” to monitor such practices? Such is my stance on this subject I would be prepared to offer my services without charge. Tim Kilpatrick Blackpool, Lancashire domingo, maio 22, 2005
Cheerleader
![]() Cada clube tem a cheerleader que merece. quinta-feira, maio 19, 2005
Esquivo
Há coisas que tenta esconder dos outros. Mas não sabe quais são.
Filme da época
«Estávamos envergonhados com o que fizemos na primeira parte. Mas decidimos reentrar no jogo e tentar perder com honra e vergonha na cara.»[Daniel Carvalho, jogador do CSKA, a seguir à final da Taça UEFA em que fez três assistências para golo e foi eleito 'o homem do jogo'.] «Eles empataram num lance em que o defesa nem sequer tirou os pés do chão, fizeram o 2-1 em contra-ataque e, quando tentávamos reequilibrar, sofremos o 3-1 contra a corrente do jogo. O Sporting foi uma equipa que assumiu o jogo desde o primeiro minuto. Se calhar, mostrámos um excesso de audácia. Tenho um grande orgulho em tudo o que fizemos até hoje.» [José Peseiro, treinador do Sporting, no final do mesmo jogo.] terça-feira, maio 17, 2005
A Praieira - um conselho, aliás, dois
Uma cerveja antes do almoço é muito bom pra ficar pensando melhor. Mas, vão por mim, não a bebam em frente ao computador enquanto tentam fazer o download da música. |
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